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segunda-feira, 19 de dezembro de 2022

Sucessos de 1919: O Despertar da Montanha

"Você acaba de fazer o seu "Danúbio Azul", disse o professor Guilherme Fontainha a Eduardo Souto, quando este lhe mostrou, ao piano, "O Despertar da Montanha". Peça essencial do repertório pianístico brasileiro, típica dos saraus do início do século, "O Despertar da Montanha" é a obra mais conhecida de Souto. Lançada em 1919, com sucesso imediato, tem na capa da edição inicial curioso desenho, que mostra uma cena pastoril de natureza européia: ao pé de suntuosa montanha, um pastor descansa tocando flauta, enquanto seu cão vigia um rebanho de quinze ovelhas...

Mas, se a cena é européia, a composição é bem brasileira, tendo ajudado até a fixar uma forma de tango, que Eduardo Souto chama de tango de salão, diferente dos tangos de Nazareth, mais próximos do choro. "O Despertar da Montanha" tem uma letra de Francisco Pimentel, que nada lhe acrescenta.

O Despertar da Montanha (tango de salão, 1919) - Eduardo Souto e Francisco Pimentel

Interpretação de Francisco Mignone e Conjunto Orquestral em 1943:

Disco 78 rpm / Título da música: Despertar da Montanha / Eduardo Souto (Compositor) / Conjunto Orquestral (Intérprete) / Francisco Mignoni [Região] (Intérprete) / Gravadora: Columbia / Nº do Álbum: 75001-b / Nº da Matriz: #594-1 / Gravação: 5/janeiro/1943 / Lançamento: 1943 / Gênero musical: Tango / Coleção de fontes: Nirez, IMS D



Interpretação de Sílvio Caldas em 1946:

Disco 78 rpm / Título da música: Despertar da Montanha / Eduardo Souto (Compositor) / Francisco Pimentel (Compositor) / Sílvio Caldas (Intérprete) / Orquestra Continental (Acomp.) / Gravadora: Continental / Nº do Álbum: 28000-b / Nº da Matriz: #1567-1 / Gravação: 5/agosto/1946 / Lançamento: 1946 / Gênero musical: Canção de tango / Coleção de fontes: Nirez



Interpretação de Roberto Fioravante em 1963:

LP Seresteiro Da Saudade Nº 5 / Título da música: O Despertar da Montanha / Eduardo Souto (Compositor) / Francisco Pimentel (Compositor) / Roberto Fioravante (Intérprete) / Gravadora: Chantecler / Nº do Álbum: CMG 2218 / Ano: 1963 / Gênero musical: Canção / Seresta



Quando a noite entra na agonia, / Surgem os primeiros raios, / Na moldura do horizonte, / Iniciam seus ensaios, / Doira-se um monte... / E os lindos ramos mais felizes, / Os que ao longe estão mais altos, / Pintam-se em matizes, / No cimo do planalto... / Sai da sombra um novo dia.

E a luz da madrugada, / Entrando suavemente na floresta, / Beija os ninhos, / E esta festa, / Desperta os passarinhos / E envolve troncos, / Vindo através das folhagens, / Em acordes selvagens, / Anunciam a alvorada.

Desses cantos, sob o sol da manhã, / Em linda festa pagã, / Escorre a vida, cheia de encantos, / E transborda, numa chuva de cores, / E entre os vales sonhadores, / A montanha acorda.


Fonte: A canção no tempo - 85 anos de músicas brasileiras (Vol. 1: 1901-1957) - Jairo Severiano e Zuza Homem de Mello.

quinta-feira, 15 de dezembro de 2022

Sucessos de 1917: Franqueza Rude

Mário Pinheiro - Jornal de Theatro & Sport (1918)

Franqueza rude (modinha, 1917) - Belchior da Silveira (Caramuru) e João B. Fittipaldi - Intérprete: Mário Pinheiro

Disco 76 rpm, 27", selo: Odeon / Título da música: Franqueza Rude / Caramuru (Compositor) / João B. Fitipaldi (Compositor) / Mário Pinheiro (Intérprete) / Piano e Violão (Acomp.) / Nº Álbum 121328 / Lançamento: 1917 / Gênero musical: Canção / Coleção de Origem: IMS, Nirez



O teu olhar, tem tanto fogo e tanto ardor,
Que é bem capaz, de seduzir e de prender,
Mais é o efeito de um capricho e não de amor,
Porque em teu peito, amor não pode mais haver.


Tem conseguido, acorrentar aos olhos teus,
Os desditosos, que se deixam iludir,
Pois há mim, não prenderás, juro por deus,
Que aos teus ardís, eu hei de sempre resistir.


Eu não me iludo não,
Com teu olhar ardente,
Porque teu coração,
Pertence há muita gente.

Acostumada a seduzir e a dominar,
Julgaste fácil, dominar a mim também,
Mas nunca ao teu querer eu hei de me curvar,
Porque sou muito altivo e como eu sou ninguém,
Tiveste um dia, a vã idéia em me fitar,
Com toda a força de teus olhos de serpente,
Eu não me deixo fascinar, por teus olhares,
Eu não me prendo nos teus olhos, na corrente.

Mesmo que teu amor,
Seja um amor sincero,
Mil vezes quero a dor,
Mas teu amor, não quero !

Não quero amor,
De quem amando, todo mundo,
Não sabe amar,
Como a um só se deve amar,
Embora o meu penar,
Seja um penar profundo,
Não hei de amar-te um segundo,
E nunca, nunca te beijar,
Transformarei meu coração num baluarte,
Pra resistir, aos teus assaltos, infernais,
Hei este orgulho dominar,
Hei de mostrar-te,
Que tu só és,
Mulher, mulher e nada mais !

Não estejas a fitar,
Assim quem não te quer,
Quem nunca ás de domar,
Quem nunca ás de vencer !...

quarta-feira, 14 de dezembro de 2022

Sucessos de 1915: Apanhei-te Cavaquinho

Ernesto Nazareth

A polca "Apanhei-te Cavaquinho" é a segunda composição mais gravada de Ernesto Nazareth, perdendo apenas para "Odeon". De andamento rápido (o autor recomendava semínima = 100 para as polcas e semínima = 80 para os tangos) é muitas vezes executada em velocidade vertiginosa por músicos exibicionistas, que presumem assim mostrar habilidade virtuosística.

Composta em 1915 e gravada no mesmo ano pelo grupo O Passos no Choro, "Apanhei-Te Cavaquinho" foi dedicada a Mário Cavaquinho (Mário Álvares da Conceição), um exímio cavaquinista, amigo de Nazareth (segundo Ary Vasconcelos, ele inventou o cavaquinho de cinco cordas e a bandurra de 14 cordas).

Em 1930 o autor gravou esta composição em disco de grande valor documental, que passou a servir de referência para novas execuções. Já classificado como choro, ganhou letra de Darci de Oliveira, em 1943, para ser gravado por Ademilde Fonseca:

Disco 78 rpm / Título da música: Apanhei-te Cavaquinho / Ernesto Nazareth (Compositor) / Darci de Oliveira (Compositor) / Ademilde Fonseca (Intérprete) / Benedito Lacerda (Acomp.) / Benedito Lacerda e Seu Conjunto (Acomp.) / Gravadora: Columbia / Nº do Álbum: 55432-a / Nº da Matriz: 630-2-M / Gravação: 20/Abril/1943 / Lançamento: Maio/1943 / Gênero musical: Choro / Coleção de Origem: Nirez, Humberto Franceschi


Ainda me lembro, / Do meu tempo de criança, / Quando entrava numa dança, / Toda cheia de esperança, / De chinelinho e de trança, / Com Mané e o Zé da França, / Nunca tive na lembrança, / De rever esse chorinho.

E hoje ouvindo, / Neste choro a voz do pinho, / Relembrando o bom tempinho, / Da mamãe e do maninho, / Hoje sou ave sem ninho, / Sem família, sem carinho, / Mas sou bem feliz ouvindo, / O "Apanhei-te Cavaquinho"!

Hoje cantando o "Apanhei-te Cavaquinho", / Fico louca, fico quente, / Fico como um passarinho, / Sinto vontade de cantar a vida inteira, / Esta vida, eu levo de qualquer maneira, / Ouvindo a flauta, o cavaquinho e o violão, / Eu sinto que o meu coração, / Tem a cadência de um pandeiro, / Esqueço tudo e vou cantando com jeitinho, / Este chorinho, / Que é muito Brasileiro !

Hoje cantando o "Apanhei-te Cavaquinho", / Fico louca, fico quente, /Fico como um passarinho, / Sinto vontade de cantar a vida inteira, / Esta vida, eu levo de qualquer maneira, / Ouvindo a flauta, o cavaquinho e o violão, / Eu sinto que o meu coração, / Tem a cadência de um pandeiro, / Esqueço tudo e vou cantando com jeitinho, / Este chorinho, / Que é muito Brasileiro !...


Fonte: A Canção no Tempo - Jairo Severiano e Zuza Homem de Mello - Editora 34.

Sucessos de 1904: Corta-Jaca


Conhecido desde 1895, quando foi lançado na opereta-burlesca "Zizinha Maxixe", o tango "Corta-Jaca", cujo título original é "Gaúcho", teve a popularidade redobrada nove anos depois, ao reaparecer na revista Cá e Lá. Comprovam o sucesso as oito gravações que recebeu entre 1904 e 1912 e sua apresentação, em 26.10.1914, numa recepção oficial no Palácio do Catete, então sede do Governo Federal. Na ocasião, foi interpretado pela primeira dama, Sra. Nair de Teffé, fato explorado como escândalo pela oposição.

"Corta-Jaca" ou "Dança do Corta-Jaca", como está classificado em uma de suas edições, é na verdade um maxixe bem sacudido, característica que muito contribuiu para o seu êxito. A fim de ser cantado em Cá e Lá, ganhou letra de Tito Martins e Bandeira de Gouveia, autores da peça ("Ai! Ai! Que bom cortar a jaca / Ai! Sim, meu bem ataca, sem descansar...").
"Não há razão para censurar o Corta-jaca, minha senhora. O tango nasceu nos cabarets escusos, mas... chegou aos salões mais finos... Fez-se por si" (Careta - Rio de Janeiro, ed. 333, de 07/11/1914). No sarau do Catete, em 1914, a primeira-dama Nair de Tefé tocou ao violão o Corta-jaca, maxixe de Chiquinha Gonzaga, causando grande escândalo. O episódio levou Rui Barbosa a ocupar a tribuna do Senado para classificar esse gênero de ritmo como "a mais vulgar e grosseira de nossas manifestações musicais".

Corta-Jaca (Gaúcho) (tango, 1895) - Chiquinha Gonzaga e Machado Careca. Essa composição de Chiquinha recebeu as mais diversas definições de gênero musical nas gravações durante o séc. XX como se nota nos exemplos abaixo.

Interpretação de Os Geraldos, acompanhados ao piano, em 1906:

Disco selo: Odeon Record / Título da música: Corta Jaca / Chiquinha Gonzaga (Compositora) / Machado Careca (Compositor) / Os Geraldos (Intérprete) / Piano (Acomp.) / Nº do Álbum: 40454 /Lançamento: 1906 / Gênero musical: Duetto / Coleção de Origem: IMS, Nirez



Interpretação de Zé da Zilda, com o Conjunto Regional de Donga, em 1938:

Disco 78 rpm / Título da música: O Corta Jaca / Chiquinha Gonzaga (Compositora) / José Gonçalves [Zé da Zilda] (Intérprete) / Conjunto Regional de Donga (Acomp.) / Gravadora: Odeon / Nº do Álbum: 11661-a / Nº da Matriz: 5906 / Gravação: 30/Agosto/1938 / Lançamento: Novembro/1938 / Gênero musical: Corta Jaca / Coleção de Origem: IMS, Nirez



Interpretação de Guio de Moraes e Seus Parentes em 1953:

Disco 78 rpm / Título da música: Gaúcho (Corta Jaca) / Chiquinha Gonzaga (Compositora) / Guio de Moraes e Seus Parentes (Intérprete) / Gravadora: Odeon / Nº do Álbum: 13523-a / Nº da Matriz: 9792 / Gravação: 15/Julho/1953 / Lançamento: Outubro 1953 / Gênero musical: Choro / Coleção de Origem: Nirez



Ai, ai, como é bom dançar, ai! / Corta-jaca assim, assim, assim / Mexe com o pé! / Ai, ai, tem feitiço tem, ai! / Corta meu benzinho assim, assim!

Esta dança é buliçosa / tão dengosa / que todos querem dançar / Não há ricas baronesas / nem marquesas / que não saibam requebrar, requebrar

Este passo tem feitiço / tal ouriço / Faz qualquer homem coió / Não há velho carrancudo / nem sisudo / que não caia em trololó, trololó

Quem me vê assim alegre / no Flamengo / por certo se há de render / Não resiste com certeza / este jeito de mexer



Fontes: A Canção no Tempo - Jairo Severiano e Zuza Homem de Mello - Editora 34​; Instituto Moreira Salles.

Sucessos de 1915: Ai, Filomena

Hermes da Fonseca
Em 1915, com o fim do mandato de Hermes da Fonseca, apelidado pelo povo de seu Dudu, surgem sátiras à sua fama de agourento. A que se tornou mais famosa é Ai, Filomena, de José Carvalho de Bulhões: "Dudu sai a cavalo/ o cavalo logo empaca/ e só começa a andar/ ao ouvir o corta-jaca.// Ai, Filomena, se eu fosse como tu,/ tirava a urucubaca/ da careca do Dudu".

O texto faz referência a um sarau no Catete, em 1914, quando a primeira-dama Nair de Tefé tocou ao violão o Corta-jaca, maxixe de Chiquinha Gonzaga, causando grande escândalo. O episódio levou Rui Barbosa a ocupar a tribuna do Senado para classificar esse gênero de ritmo como "a mais vulgar e grosseira de nossas manifestações musicais".

Ai, Filomena (marcha, 1915) - J. Carvalho Bulhões - Interpretação: Bahiano

Disco selo (76 rpm, 27"): Odeon Record / Título da música: Ai!.. Philomena / J. Carvalho Bulhões (Compositor) / Bahiano (Intérprete) / Conjunto (Acomp.) / Nº Álbum: 120988 / Lançamento: 1915 / Gênero musical: Canção / Coleção de Origem: IMS, Nirez



Ai, minha sogra / Morreu em Caxambu / Com a tal urucubaca / Que lhe deu o seu Dudu // Ai, Filomena / Se eu fosse como tu / Tirava a urucubaca / Da careca do Dudu

Dudu quando casou / Quase que levou a breca / Por causa da urucubaca / Que ele tinha na careca // Ai, Filomena / Se eu fosse como tu / Tirava a urucubaca / Da cabeça do Dudu

Na careca do Dudu / Já trepou uma macaca / E por isso coitadinho / É que tem urucubaca // Ai, Filomena / Se eu fosse como tu / Tirava a urucubaca / Da careca do Dudu

Dudu tem uma casa / E com chave de ouro / Quem lhe deu foi o Conde / Com os cobres do Tesouro // Ai, Filomena / Se eu fosse como tu / Tirava a urucubaca / Da careca do Dudu

Se o Dudu sai a cavalo / O cavalo logo empaca / Só começa a andar / Ao ouvir o Corta-jaca // Ai, Filomena / Se eu fosse como tu / Tirava a urucubaca / Da careca do Dudu

Dudu tem uma casa / Que nada lhe custou / Porque nesse presente / Foi o povo que marchou // Ai, Filomena / Se eu fosse como tu / Tirava a urucubaca / Da careca do Dudu

Mas a rainha / Cavou o seu também / Dizendo no Senado / Tão somente "muito bem" // Ai, Filomena / Se eu fosse como tu / Tirava a urucubaca / Da careca do Dudu

Eu me arrependo / De ter ido ao Caju / E não ter vaiado / A saída do Dudu // Ai, Filomena / Se eu fosse como tu / Tirava a urucubaca / Da careca do Dudu

Bahiano: -Vocês estão falando, ele nem faz caso. Está comendo do bom e do melhor!



Fonte: Portal SESCSP - A MPB canta e conta nossa história

Sucessos de 1913: Caboca de Caxangá

Catulo da Paixão Cearense: Um sertanejo do Sertão

Em entrevista a Joel Silveira, nos idos de 1940, Catulo da Paixão Cearense declarou-se "um sertanejo do sertão", ressaltando o mérito de saber descrevê-lo muito bem, apesar de não conhecê-lo. Parte desse mérito ele deveria creditar ao violonista João Pernambuco (João Teixeira Guimarães), com quem conviveu por diversos anos e que lhe forneceu, além de alguns temas musicais, um variado vocabulário sertanejo que usaria em seus versos. Um exemplo dessa colaboração é a composição "Caboca de Caxangá", que entrou para a história assinada apenas pelo poeta.

Inspirado numa toada que João lhe mostrara e que teria melodia do violonista, composta sobre versos populares, Catulo escreveu extensa letra, impregnada de nomes de árvores (taquara, oiticica, imbiruçu...), animais (urutau, coivara, jaçanã...), localidades (Jatobá, Cariri, Caxangá, Jaboatão...) e gírias do sertão nordestino, daí nascendo em 1913 a embolada Caboca de Caxangá, classificada no disco como batuque sertanejo. E nasceu para o sucesso, que se estenderia ao carnaval de 1914, para desgosto de Catulo, que achava depreciativo o uso da composição pelos foliões.

A seguir algumas gravações da melodia acima:

Cabocla de Caxangá (batuque, 1913) - Catulo da Paixão Cearense e João Pernambuco - Intérpretes: Júlia Martins, Eduardo das Neves e Bahiano

Disco selo: Odeon Record / Título da música: Cabocla de Caxangá / Catulo da Paixão Cearense (Compositor) / João Pernambuco (Compositor) / Eduardo das Neves (Intérprete) / Bahiano (Intérprete) / Júlia Martins (Intérprete) / Grupo da Casa Edison (Acomp.) / Nº do Álbum: 120521 / Nº da Matriz: 120521 / Gravação: 2/Janeiro/1913 / Lançamento: 1913 / Gênero musical: Batuque Sertanejo / Coleção de Origem: IMS, Nirez



Interpretação de Paulo Tapajós em 1972:

LP No Tempo Dos Bons Tempos - Luar Do Sertão - Músicas de Catullo e Joubert / Título da música: Cabocla de Caxangá / João Pernambuco (Compositor) / Catulo da Paixão Cearense / Paulo Tapajós (Intérprete) / Gravadora: Fontana/Philips / Álbum: 6488 014 / Ano: 1972 / Tracklist: A6 / Gênero musical: Embolada / Batuque sertanejo / Obs.: Extraidos dos LPs de 10 polegadas gravados na Sinter em 1956: SLP 1052 e SLP 1082



E------------------- C7------------------ Fm
Laurindo Punga, Chico Dunga, Zé Vicente
-------------------------B7----------------------E
E esta gente tão valente / Do sertão de Jatobá,
-----------------------C7----------- Fm
E o danado do afamado Zeca Lima,
--------------------------B7-------------------------E
Tudo chora numa prima, / E tudo quer te traquejá.

---------------------B7------------------------E
Caboca di Caxangá, / Minha caboca, vem cá.

------------E---------- C7-------------- Fm
Queria ver se essa gente também sente
-----------------------------B7
Tanto amor, como eu senti,
----------------------------E
Quando eu te vi em Cariri!
-----------------------C7----------- Fm
Atravessava um regato no quartau
-----------------------B7------------------------- E
E escutava lá no mato / O canto triste do urutau.

------------------------B7---------------------------E
Caboca, demônio mau, / Sou triste como o urutau!

E------------------- C7---------------------- Fm
Há muito tempo, lá nas moita das taquara,
-----------------------------B7--------------------------E
Junto ao monte das coivara, / Eu não te vejo tu passá!
------------------C7-------------- Fm
Todo os dia, inté a boca da noite,
------------------------B7----------------------E
Eu te canto uma toada / Lá debaixo do indaiá.

-------------------------B7----------------------E
Vem cá, caboca, vem cá, / Rainha di Caxangá.

E------------------ C7------------------ Fm
Na noite santa do Natal na encruzilhada,
--------------------------B7--------------------------E
Eu te esperei e descantei / Inté o romper da manhã!
--------------------------C7------------ Fm
Quando eu saía do arraiá, o sol nascia
-------------------------B7-------------------E
E lá na grota já se ouvia / Pipiando a jaçanã.

------------------------B7--------------------------E
Caboca, flor da manhã / Sou triste como a acauã!


Fontes: A Canção no Tempo – Jairo Severiano e Zuza Homem de Mello – Volume 1 - Editora 34; Álbum: Luar do Sertão - Músicas de Catullo e Joubert (1972).

Sucessos de 1913: Lágrimas e Risos

Bahiano (Manuel Pedro dos Santos, 1887-1944) 

Lágrimas e risos (valsa, 1913) - Eustórgio Wanderley e Adelmar Tavares - Interpretação: Bahiano

Disco selo: Odeon Record / Título da música: Lágrimas e risos / Adelmar Tavares (Compositor) / Eustórgio Vanderley (Compositor) / Bahiano (Intérprete) / Violão (Acomp.) / Nº do Álbum: 120271 / Nº da Matriz: 120271-2 / Gravação: 22/Setembro/1911 / Lançamento: 1913 / Gênero musical: Valsa / Coleção de Origem: IMS



A vida é toda feita assim
De riso e dor um mar sem fim
Alegre um dia o riso vem
E o pranto seguirá também

A criancinha assim que nasce
Conhece a dor, põe-se a chorar
No entanto o riso em sua face
Só muito após vem a aflorar

Sorrir, chorar e assim vai-se a vida a passar
Cantar, gemer, a mágoa vem junto ao prazer
É louco também quem nos diz, que se considera feliz
Que a sorte aos seus braços lhe atira, mentira, mentira
Pois breve ao invés de cantar
Chorar, chorar

Eu que cantando estou hoje aqui
Enquanto o público sorri
Quem sabe se em vez de cantar
Tenho vontade de chorar

Num circo, vê-se sobre a arena
Ri o palhaço a se perder
E em casa a filha assim pequena
Talvez deixasse-lhe a morrer

Sorrir, chorar e assim vai-se a vida a passar
Cantar, gemer, a mágoa vem junto ao prazer
Palhaço que ri sem cessar
Não deve não pode chorar
Pois quem é pago pra rir pra chalaça
Desgraça, desgraça
Se em pranto tens alma de par
Sorrir, cantar




Sucessos de 1914: Urubu Malandro

Com o título de "Samba do Urubu" e classificado como "dança característica", o "Urubu Malandro" foi gravado pela primeira vez em 1914(¹). O disco (Phoenix n° 70589) tinha como intérprete Lourival Inácio de Carvalho, o Louro, compositor, instrumentista e solista do grupo (clarinete, cavaquinho e violão) que levava o seu nome. Este mesmo Louro, a quem é geralmente atribuída a autoria da composição, é na verdade somente o autor das variações que a popularizaram.

O "Urubu Malandro" é um antigo tema folclórico da região norte do estado do Rio de Janeiro. Tema, aliás, excelente para improvisos, sendo um dos preferidos de Pixinguinha e outros mestres do choro como Benedito Lacerda e Altamiro Carrilho, ambos nascidos na mesma região onde surgiu o curioso tema.

Urubu malandro (dança característica, tema folclórico, 1914) - Autor desconhecido - Letra: João de Barro - Intérprete: Grupo do Louro

Disco selo: Disco Phoenix / Título da música: Samba do Urubú / Tema Folclórico / Grupo do Louro [Clarinete, Cavaquinho, Violão] (Intérprete) / Nº do Álbum: 70589 / Lançamento: 1913 / Gênero musical: Dança Característica / Coleção de Origem: IMS / Obs.: No rótulo ou selo do disco aparece o nome "Lourizani" debaixo do título da música.



Interpretação de Paulo Moura & Os Batutas em 1997:

CD Pixinguinha - Paulo Moura & Os Batutas / Título da música: Urubu Malandro / Tradicional / Lourival de Carvalho "Louro" (Adpt.) / João de Barro (Adpt.) / Paulo Moura (Intérprete) / Gravadora: Velas / Álbum: 11-V195 / Referência/Tributo: Pixinguinha / Ano: 1997 / Gênero musical: Choro / Obs.: Gravado ao Vivo no SESC-Barra Mansa - Rio de Janeiro, em 1997.


------A --------------------------------------E7
Urubu veio de riba / Com fama de dançadô
-----------------------------------------------A
Urubu chegou no Rio / Urubu nunca dançou
---------------------E7-------------- A
Dança, dança urubu / Eu não, sinhô

-------A-------------------------------------- E7
Urubu não vai ao céu / Nem que seja rezadô
-------------------------------------------------A
Urubu catinga muito / Persegue Nosso Senhor
------------------E7-------------- A
Foge, foge urubu / Eu não, sinhô

--------A----------------------------------- E7
Urubu está cantando / Que nada sabe dizê
---------------------------------------------------A
Em Mato Grosso se ouve: / Que foi a tropa fazê?
-----------------E7------------- A
Fala, fala urubu / Eu não, sinhô

--------A -----------------------------------------E7
Urubu lá do Pará / Quem tem fama de avançadô
--------------------------------------------------------A
Larga o trono, vem embora / Deixa o Lauro por favô
--------------------E7-------------- A
Deixa, deixa urubu / Eu não, sinhô

-------A------------------------------ E7
Urubu delegado / É um moço de valô
------------------------------------------------A
É bonito e é letrado / Sabe mais que um dotô
------------------E7------------- A
Sabe, sabe urubu / Eu não, sinhô

-------A ---------------------------------E7
Urubu municipá / Larga o osso por favô
------------------------------------------------------A
Vê se come os intendente / Da mão do bispo, sinhô
--------------------E7------------- A
Come, come urubu / Eu não, sinhô

-------A--------------------------------------- E7
Urubu chega disposto / Deixa o povo por amô
-----------------------------------------------------A
Corta os casaca-lavado / Que é pessoá avançadô
--------------------E7------------- A
Corta, corta urubu / Eu não, sinhô

--------A------------------------------------ E7
Urubu Nascimento / Carinha que Deus pintô
-----------------------------------------------A
Meta a mão na algibeira / Paga aquele cantor
-------------------E7------------- A
Paga, paga urubu / Eu não, sinhô


(¹) Segundo o Instituto Moreira Salles o ano de lançamento foi 1913. A "A Canção no Tempo" diz que foi gravado em 1914.

Fonte: Fonte: A Canção no Tempo – Jairo Severiano e Zuza Homem de Mello – Editora 34; Instituto Moreira Salles.

Sucessos de 1914: São Paulo Futuro

Marcelo Tupinambá (Fernando Álvares Lobo - 29/5/1889 Tietê, SP - 4/7/1953 São Paulo, SP) musicou, em 1914, a revista musical "São Paulo Futuro", de Danton Vampré, que estreou no Teatro São José, em São Paulo. Em 1915 a canção "São Paulo futuro" foi gravada na Odeon pelo cantor Bahiano. Em 1917, musicou a revista "Cenas da roça", escrita por Arlindo Leal (José Eloy).

São Paulo Futuro (Maxixe Curtindo) (maxixe, 1914) - Marcelo Tupinambá - Intérprete: Bahiano

Disco selo: Odeon Record / Título da música: São Paulo Futuro (Revista) - Maxixe "Cortindo" / Marcelo Tupynambá (Compositor) / Bahiano (Intérprete) / Orquestra (Acomp.) / Nº do Álbum: 120986 / Nº da Matriz: R-16 / Lançamento: 1915 / Gênero musical: Maxixe / Coleção de Origem: IMS, Nirez



Interpretação do cantor Roberto Fioravanti em 1968

LP Mensagem De Saudade (Vinyl) / Título da música: São Paulo Futuro / Marcelo Tupinanmbá (Compositor) / Roberto Fioravanti (Intérprete) / Gravadora: Chantecler / Álbum: CMG 2425 / Ano: 1968 / Gênero musical: Maxixe


Vem morena / pro teu furrié / tu não tens penado teu Mané.
Eu te espero / gemendo de dô / e desespero sem o teu amô

Ai, vem meu bem, / tu já deu teu coração...
Ai, tu não vem, / pois eu morro de paixão. (bis)

Vem marvada / este pranto secá / nas labaredas do teu olhar
Tu parece não ter coração / porque tu some, faz ingratidão.

Ai, vem meu bem...

Eu te imploro / pela última vez: /
Fica lá em casa / somente um mês, /
E depois que esse amô / tu prová /
Tu nunca mais há / de me abandoná.

Ai, vem meu bem...



Fonte: Dicionário Cravo Albin da MPB; Instituto Moreira Salles; Instituto Memória Musical Brasileira (IMMuB).

Sucessos de 1914: Moleque Vagabundo

Moleque vagabundo (samba, 1914) - Louro (Lourival de Carvalho)

Uma composição que o seu Lourival de Carvalho, o popular "Louro" lhe põe o gênero como "samba". E a música intitulada Pelo telefone, de 1917, não foi considerado o primeiro samba? Durma-se agora com um barulho desses...

Disco selo: Odeon Record / Título da música: "Muleque" vagabundo / Lourival de Carvalho (Compositor) / Grupo Odeon [Bombardino, Pistão, Clarinette, Cavaquinho e Violão] (Intérprete) / Nº do Álbum: 120979 / Gravação: Julho/1914 / Lançamento: 1914 / Gênero musical: Samba / Coleção de Origem: IMS





Fonte: Instituto Moreira Salles (material fonográfico).

terça-feira, 13 de dezembro de 2022

Sucessos de 1914: Luar do Sertão

Luar do Sertão (toada, 1914) - João Pernambuco e Catulo da Paixão Cearense - Interpretação: Francisco Alves

Disco 78 rpm / Título da música: Luar do Sertão / João Pernambuco (Compositor) / Catulo da Paixão Cearense (Compositor) / Francisco Alves (Intérprete) / Orquestra Odeon, Lírio Panicali [Direção] (Acomp.) / Nº do Álbum: 12377-b / Nº da Matriz: 7395 / Gravação: 5/Outubro/1943 / Lançamento: Novembro/1943 / Gênero musical: Canção



Eduardo das Neves, o cantor-circense Dudu, interpreta na primeira gravação em 1914:

Disco selo: Odeon Record / Título da música: O Luar do Sertão / João Pernambuco (Compositor) / Catulo da Paixão Cearense (Compositor) / Eduardo das Neves (Intérprete) / Piano e coro (Acomp.) / Nº do Álbum: 120911 / Nº da Matriz: 120.911=3 / Lançamento: Fevereiro/1914 / Gênero musical: Toada sertaneja / Coleção de Origem: IMS, Nirez / Obs.: No rótulo do disco consta Catullo Cearense (Catulo) como compositor da melodia e da letra.


--------G ----------Em -------Am --------D7-------- G----- D7
Não há, ó gente, oh não luar / Como este do sertão (bis)

--------------G------- Em------------ Am--------------------------- D7
Oh que saudade do luar da minha terra / Lá na serra branquejando
------------------------G D7------- G--------- Em---------- Am
Folhas secas pelo chão / Esse luar cá da cidade, tão escuro
--------------------------D7------------------- G------- D7
Não tem aquela saudade / Do luar lá do sertão (refrão)

--------------G --------Em ---------Am--------------------------- D7
A gente fria desta terra sem poesia / Não se importa com esta lua
-----------------------G D7------------- G--------- Em------- Am
Nem faz caso do luar / Enquanto a onça, lá na verde capoeira
------------------------D7-------------------- G------ D7
Leva uma hora inteira, / Vendo a lua a meditar (refrão)

-----------------G--------------- Em---------- Am
Ai, quem me dera que eu morresse lá na serra
------------------------D7---------------------- G------- D7
Abraçado à minha terra e dormindo de uma vez
-------------G------------- Em --------Am
Ser enterrado numa grota pequenina
------------------------D7 ----------------G -------D7
Onde à tarde a surunina chora sua viuvez (refrão).


Fonte: A Canção no Tempo - Vol. 1 - Jairo Severiano e Zuza Homem de Mello - Editora 34.

Sucessos de 1913: Subindo Ao Céu

Chegando ao Brasil com a família real portuguesa, no início do século XIX, a valsa de salão popularizou-se, passando a ser um gênero de execução obrigatória em bailes, confeitarias e retretas. Na virada do século, adotada pelos conjuntos de choro, tornou-se seresteira, influenciando a tradicional modinha, que tomou ritmo ternário.

Um bom exemplo de valsa de nossa belle époque é a elegante "Subindo ao Céu", obra prima do pianista Aristides Manuel Borges (1884-1946), que resiste ao tempo permanecendo no repertório de nossos instrumentistas.

Uma prova disso é a sua discografia que, além de pianistas como Arthur Moreira Lima, Antônio Adolfo e Mário de Azevedo, inclui flautistas (Altamiro Carrilho, Dante Santoro), acordeonistas (Luiz Gonzaga), bandolinistas (Jacó) e violonistas (Dilermando Reis, Édson José Alves). Composta no formato A-B-A-C-A, "Subindo ao Céu" proporciona certa liberdade rítmica de interpretação, o que lhe acrescenta um especial encanto.

Algumas gravações deste tema:

Disco 78 rpm / Título da música: Subindo ao céu / Aristides Borges, 1884-1946 (Compositor) / Dante Santoro [Flauta] (Intérprete) / Pereira Filho, Luiz Bittencourt e Luperce Miranda (Acomp.) / Gravadora: Victor / Nº do Álbum: 33968-a / Nº da Matriz: 79950-1 / Gravação: 1/Julho/1935 / Lançamento: Agosto/1935 / Gênero musical: Valsa



Interpretação de Luiz Gonzaga em 1944:

Disco 78 rpm / Título da música: Subindo ao céu / Aristides Borges, Aristides, 1884-1946 (Compositor) / Luiz Gonzaga [Acordeon] (Intérprete) / Conjunto (Acomp.) / Gravadora: Victor / Nº Álbum 80-0171-a / Nº da Matriz: S-052924-1 / Gravação: 14/Fevereiro/1944 / Lançamento: Abril/1944 / Gênero musical: Valsa




Fonte: A Canção no Tempo - Jairo Severiano e Zuza Homem de Mello - Editora 34.

segunda-feira, 5 de dezembro de 2022

Lan e os Músicos de 1950



Lançou "Aquarela do Brasil" e chamou o Brasil de "mulato inzoneiro". O Flávio Cavalcanti disse que isso é a mesma coisa que "mestiço intrigante" e o mineiro de Ubá ficou louco da vida. O Flávio até tentou se desculpar, indo na casa dele. O Ary comprou um cão policial e o deixou na frente de sua casa para esperar.... Ao lado Araci de Almeida, comemorando seu aniversário, na ocasião, em São Paulo, e o próprio Governador (que não fora convidado) disse: "Vim pessoalmente apertar a mão da maior cantora popular do Brasil”. Araci sorriu encabulada e respondeu sincera: “Governador, isto são lantejoulas de sua parte”.



Herivelto sofre o complexo do apito. Quando o “Praça Onze” agradou, ele castigou logo em seguida o “Laurindo”, aquele que dizia assim: — Laurindo, pega o apito... etc., etc. Laurindo sumiu e o apito ficou com Herivelto... Maysa (Perdi meu pente) Matarazzo é Bonjardim de nascença. Um dia houve uma festa para os melhores do rádio. Maysa foi convidada, Andrezinho Matarazzo acompanhou-a e, quando deu com o ambiente exclamou para si mesmo: — Eu salto aqui! Para encerrar, mais duas charges dessa época: Pixinguinha e José Vasconcelos...




Fonte: Dicionário Ilustrado — Texto de Stanislaw Ponte Preta — Desenho de Lan — Jornal "Última Hora"

Inauguração da Rádio Nacional

Fotos: Elisa Coelho, a magnífica intérprete de canções brasileiras, quando era apresentada por Celso Guimarães, um dos melhores "speakers" com que conta atualmente o Rio; Bidu Sayão, a maior cantora do Brasil e uma das melhores do mundo, emprestou brilho excepcional à inauguração da PRE-8, cantando duas lindas canções; Orlando Silva, o inconfundível cantor de nossa música sentimental e um dos grandes sucessos da noite de estreia da PRE-8.


Eis aqui, amigos, amantes da MPB e arqueólogos musicais, mais uma reportagem da revista CARIOCA intitulada "Do Rio para todo o Brasil", de 19/9/1936, sobre a festa da inauguração da PRE-8, a Rádio Nacional do Rio de Janeiro, ocorrida em 12/9/1936, e, que bom: com fotos ...

"Teve um brilho excepcional a inauguração da Sociedade Rádio Nacional. No estúdio do edifício de "A Noite", além de vários membros do governo, representantes de altas autoridades, deputados, vereadores, delegações de instituições culturais, de sociedades difusoras, artistas e membros de letras, compareceram as mais representativas figuras da sociedade brasileira.

Fotos: Bob Lazy, o interessante intérprete de "foxes" gênero "hot", cantando acompanhado por Pereira Filho, "The music goes round and around"; a cantora paulista Roxane, interpretando canções francesas, foi, acompanhada pela orquestra, sob a direção de Romeu Ghipsman.
Entre os presentes se notavam o presidente do Senado Federal, embaixadores da França, Portugal e Japão; ministros de Estado, presidente da Academia Brasileira, da Câmara Municipal, da Associação Brasileira de Letras, diretor do Departamento Nacional de Propaganda e Difusão Cultural e várias outras personalidades de relevo.

A solenidade foi iniciada executando-se o Hino Nacional pela orquestra do Teatro Municipal. Em seguida, falou o Dr. Medeiros Netto, presidente do Senado. Seguindo com a palavra, abençoando a Rádio Nacional, o Cardeal Arcebispo, falou do Palácio de S. Joaquim, ao microfone da PRE-8. (À direita Nuno Roland - catarinense de Joinville -, grande intérprete de nossa música, que cantou pela 1a. vez no Rio).

Fotos: Sylvinha Mello, como intérprete do nosso folclore, é um dos mais destacados nomes do "cast" da PRE-8. Na inauguração da nova estação, Sylvinha foi um dos grandes sucessos; Amalia Diaz, a intérprete de tangos da PRE-8, apresentando uma interessante música argentina; o samba tem em Aracy de Almeida uma de suas maiores intérpretes. Inaugurando a PRE-8 e cantando um samba carioca, ela mais uma vez reafirmou a sua incomparável interpretação.


Falaram a seguir, proferindo expressivas orações, o embaixador de Portugal, na qualidade de sub-decano do corpo diplomático; o ministro da Educação, como orador oficial da cerimônia; os embaixadores da França e do Japão e o representante do embaixador argentino; presidente da Câmara Municipal o diretor do Departamento Nacional de Propaganda, o presidente da Confederação de Radiodifusão, o presidente da A. B. I., o Sr. Castellar de Carvalho, nosso companheiro de "A Noite", e o diretor-presidente da Sociedade Rádio Nacional, Dr. Cauby de Araújo.

Fotos: A inauguração da Rádio Nacional foi prestigiada pela presença de grande número de pessoas da nossa melhor sociedade, como se pode avaliar pela fotografia; Sônia Carvalho, a querida estrela de São Paulo, cantando um samba, acompanhada pelo Regional da PRE-8, com Pereira Filho e Dante Santoro.

 Os destacados cantores do elenco do Municipal, Bidu Sayão, Maria de Sá Earp, Giuseppe Danise, Bruno Landi, Aurélio Marcato, a ilustre pianista Dyla Joseti, o conhecido artista Mário de Azevedo e a orquestra do Teatro Municipal executaram a parte de honra do programa musical, a que se seguiram os demais números a cargo do "cast" da Rádio Nacional, que se inaugurou assim com um acontecimento mundano de raro brilho e grande repercussão."

Dolly Ennor cantando a música de câmera - "La Wally", que obteve um dos maiores sucessos da noite.


Eis a inauguração da famosa Rádio Nacional do Rio de Janeiro, em 12 de setembro de 1936, cujo evento aqui é ilustrado pela revista CARIOCA, com fotos de alguns artistas, alguns esquecidos pelos brasileiros, que nem sequer possuem uma biografia digna aqui na NET. Boa Noite!


Fonte: CARIOCA, de 19/9/1936 (texto atualizado e fotos).

Aurora Miranda: Para os Fãs do Rádio


Aurora Miranda apareceu como satélite de Carmen Miranda e encorajada por Francisco Alves, que a lançou em músicas de São João, em discos, no rádio e no palco do Recreio, onde interpretou com sucesso uma das músicas premiadas no primeiro concurso de músicas de junho de "A Noite", intitulada "Cabôco do zóio grande".

Aurora Miranda cantou na Phillips, na Mayrink Veiga e, agora acompanhando sempre os passos da irmã, está na Rádio Tupy. Aurora esteve em Buenos Aires e conquistou aplausos cantando para o público portenho.


Fonte: CARIOCA, de 12/12/1936.

Anos 1930: O Samba e Suas Intérpretes


Por que o samba é diferente na voz de cada uma de suas intérpretes?  O samba é um ritmo vitorioso. Nascido das primeiras expansões de um povo triste, conseguiu evoluir, vivendo hoje dentro do sorriso feliz de toada a gente.

Música que se modifica durante todo o ano, apresenta-se paradoxalmente durante o Carnaval, num estilo só. É o samba com a obrigação de ser alegre.

Mas as cantoras de rádio — que são as principais animadoras do ritmo fremente, sabem variá-lo de acordo com as suas próprias interpretações. O samba torna-se diferente nos lábios e na voz de cada uma, muda de aspecto, de acordo com a personalidade que o interpreta, conseguindo as mais variadas expressões.

As artistas que se dedicam ao gênero popular, devem muito ao êxito do samba o sucesso das suas carreiras. Mas também elas são reconhecidas ao ritmo que não exige muita voz, nem muito estudo para o triunfo definitivo. Apenas personalidade. E é essa mesma personalidade que se desdobra, se multiplica, dando a cada intérprete do samba uma particularidade nova.

Carmen Miranda

Carmen Miranda - 1936
O samba na voz de Carmen Miranda tem uma finalidade única: agradar, empolgando o público. Carmen canta para os seus fãs, gosta de ver muita gente em redor de si, entusiasma-se com o próprio entusiasmo que desperta.

Nos seus lábios, o samba é um ritmo brejeiro, que segue literalmente a personalidade e o temperamento da sua intérprete. Canta sorrindo, enfeitando a música, sem cuidar de vãos e efêmeros sentimentalismos.

— O samba é para mim, antes de tudo um meio fácil de conseguir uma boa situação na vida, declara a a popular cantora que é atualmente a artista mais bem remunerada do “broadcasting” carioca.

A atual estrela de PRE-3 não se inspira nos romances de todo o dia para ajudar a sua interpretação — para ela, o samba é bem a música que evoluiu ...

Aracy de Almeida

Quando Aracy surgiu cantando sambas, há algum tempo, disseram que ela estava procurando assimilar o estilo de Marília Batista. Aracy sacudiu a cabeça, onde as ideias parecem vários batalhões em marcha e continuou cantando.

Hoje, o samba tem na voz de Aracy de Almeida uma das suas principais intérpretes. O samba cantado pelo timbre da sua voz é diferente: malandro sem ser “brejeiro”, vivo porém sem rebuscamentos de “breques” fora do compasso é positivamente criado pelo seu temperamento original.

— Não faço questão de microfone, diz ela. O que eu quero é cantar, tenha público em roda, ou não, ou existam unicamente as quatro paredes do meu quarto.

Ela é o samba na sua expressão mais tropical. Um samba que sabe onde nasceu, que não nega a sua origem e tem orgulho de ser simplesmente samba ...

O microfone de PRE-8 conhece bem os caprichos da vitoriosa artista, concedendo-lhe de vez em quando férias, capazes de ajudá-la a satisfazer o seu grande desejo: cantar sempre, em toda a parte ... Agora mesmo, Aracy regressa de uma de suas excursões ao sul, continuando a encantar os ouvintes da PRE-8.

Aurora Miranda

Aurora é a artista que teve a obrigação de ser diferente: lançada e guiada pelo tirocínio de Carmen Miranda, ouvindo a todo o instante o inconfundível estilo da sua vitoriosa irmã, Aurora sentiu mais que todas as outras intérpretes de samba vontade de criar um modo pessoal, um gênero particular de interpretar o exploradíssimo ritmo. E venceu, deixando de lado toda a expansão inútil e exterior. Ela é a personificação do samba discreto, bem ensaiado, agradavelmente cantado.

Acompanhando Carmen Miranda, contratou-se recentemente na Rádio Tupy. Ali Aurora continua cantando criteriosamente, apresentando aos ouvintes do “Cacique do Ar” um samba ultracivilizado e tão bonito como o seu sorriso sem artifícios ...

Marília Batista

— “Princesinha do Samba”, chamou-a há tempos Paulo Roberto.

— “A melhor cantora”, dizem alguns fãs exaltados. — “Uma menina que ainda está começando” ... — declara Marília com o seu mais ingênuo sorriso.

Marília Batista - 1936
Mas a verdade é que Marília tem um pensamento para cada novo samba e um samba novo para cada audição. Ela é a campeã da inspiração, a esplêndida recordista da música popular, a garota para quem o samba é sempre a confissão que os lábios nunca diriam, se o samba não existisse ...

— O meu primeiro vagido foi ritmado em compasso de samba, diz Marília. Trago o samba nas veias, sinto-o pulsando dentro do meu peito em perfeita harmonia com o tic-tac do coração ...

Ela é a única artista que se dedica apaixonadamente ao sentimento das suas audições. O microfone, diante dela é um pretexto para as suas íntimas expansões e a sonhadora inquietude das suas ideias.

Garota que nasceu artista, não precisa fingir para cantar com a expressão mais verdadeira.

— Sozinha, com o meu violão, cantarolando, eu amo o samba, componho-o como se procurasse descobrir um novo mundo ou inventasse um motivo decisivo para minha felicidade, — diz Marília com um olhar dos seus olhos grandes, cheios de vivíssima luz. A esplêndida cantora conseguiu em pouco tempo um lugar marcante entre as principais intérpretes de samba do nosso “broadcasting”.

Odete Amaral

Odete também é diferente, porque segue, enquanto canta, todos os seus impulsos. Faz-se triste, sente-se verdadeiramente infeliz, enquanto interpreta um samba falando de traição e de abandono. Mas quase sempre deixa o microfone rindo e nunca se preocupa demasiadamente com a música que já cantou.  Interessa-a a nova audição — embora seja inteiramente diferente.

Na sua voz o samba é lento, lembra sempre alguém que procura por sua própria vontade retardar uma finalidade qualquer.

Mas é um ritmo vitorioso, porque a voz de Odete é bonita, a sua expressão embora falsa encanta e também porque ela possui principalmente o que é essencial para vencer no “broadcasting”: personalidade.

O seu contrato na PRD-2 foi recentemente renovado.

Alzirinha Camargo

Alzirinha Camargo - 1936
O samba foi para Alzirinha uma lição de filosofia prática. Ela interpretava canções folclóricas tristes e passadistas, quando ganhou de presente um samba cheio de vida e de alegria. Interpretou-o, logo de início, com uma voz viciada pela garoa de São Paulo. Mas venceu. A sua própria voz foi aos poucos se modificando, adquirindo um timbre decisivo para a interpretação perfeita do seu novo gênero.

Hoje, Alzirinha é diferente por muitos motivos: aprendeu com o samba a viver sorrindo, a cantar pensando com alegria nos seus últimos contratos.

— O samba é bom de ser interpretado, principalmente durante o período carnavalesco, diz a vitoriosa cantora que sempre consegue nessa época o mais sensacional êxito.

Ela é a boneca loura do samba, motivo de inspiração para a própria melodia que lhe deu sucesso.

Dircinha Batista

Diricnha Batista - 1936
A “garotinha deliciosa” ainda não firmou definitivamente a sua interpretação. Por enquanto, é ainda uma criaturinha cheia de vida, que gosta de contar ao microfone as mágoas alheias, mas sem sentir absolutamente nenhum abalo com as demonstrações sentimentais. A sua voz, cantando, é naturalmente triste. Fala talvez de uma personalidade emotiva que repousa escondida dentro dos seus sentidos juvenis. Mas é ainda uma promessa ...

— Canto samba desde pequenina. Antes, interpretava músicas do repertório de outras cantoras, hoje tenho o meu.

Dircinha agrada. Viva, inteligente, cheia de encantador desembaraço, é uma artista que poderá se firmar definitivamente no gênero escolhido. Na PRA-9 ela continua a apresentar continuamente novos sambas de vários autores. Na sua voz, o samba também é diferente: porque ensaia com vida as primeiras emoções ...


Fonte: CARIOCA, de 12/12/1936 (texto atualizado).

A marcha chinesa que dominou um carnaval

De todas as músicas surgidas para os próximos festejos de Momo, só uma conseguiu um sucesso fulminante até agora: -- é a marcha chinesa "Lig-Lig-Lig-Lé", de Paulo Barbosa e Oswaldo Santiago.

Em poucos dias, mal as estações de rádio começaram a rodar o disco, esgotava-se o primeiro milheiro de partes de piano e outro tanto de chapas fonográficas.

Na época que corre, em que a vendagem decaiu de forma desoladora, "Lig-Lig-Lig-Lé", parece destinada a um recorde de bilheteria, como se diz em linguagem de teatro e cinema.

"Lig-Lig-Lig-Lé" foi gravada em discos por Castro Barbosa, o cantor que gravou "O teu cabelo não nega".

Lá vem o seu China / Na ponta do pé
Lig lig lig lig lig lig lé!
Dez tões, vinte pratos / Banana e café
Lig, lig, lig, lig, lig, lig, lé!

Chinês / Come somente uma vez por mês
Não vai / Mais a Xangai / Buscar a Butterfly
Aqui, com a morena / Fez a sua fé / Lig, lig, lig, lé!



Fontes: "O Malho", de 7 de janeiro de 1937 (artigo e foto); Youtube.

A viagem de Sylvinha Mello

"A attracção do cinema - Um film dramatico que será produzido no Ceará" (Carioca, de 13/3/1937)


"A pouco e pouco o nosso meio radiofônico está perdendo os seus ases ante o evidente progresso do nosso meio cinematográfico. Quando começou a se firmar o cinema na nossa terra, quando ele se mostrou mesmo com grandes tendências para uma perfeição pouco longínqua, os artistas do nosso rádio e do nosso teatro abandonaram céleres, as suas precedentes ocupações e se passaram para a tela prateada. Alguns gostaram. E ficaram. Outros gostaram. Mas não ficaram ...

O teatro cede muito elementos para o cinema, mas o rádio não lhe fica atrás. O rádio é um intermédio. Os artistas saem do teatro para o rádio, deste para o cinema. Adquirem, assim, ao microfone, a dicção necessária para uma boa película.

Sylvinha Mello começou muito bem no rádio. Tem uma voz agradável e um jeito todo especial para cantar canções. E é dona de agradabilíssimo palmo de face. É justo, pois, que o cinema a seduzisse. E seduziu-a mesmo.

Quando Raul Roulien organizou o elenco de artistas que seriam filmados na sua primeira produção brasileira "O Grito da Mocidade", não se esqueceu de dar um pequeno papel a Sylvinha Mello. E ela agradou bem na parte que lhe coube. Além de ser muito elegante, demonstrou possuir grande parte do jeito comediógrafo de que todos nós temos uma parte ...

Sylvinha Mello gostou do cinema e o cinema gostou de Sylvinha Mello. Mas ela não abandonou definitivamente o "broadcasting". O cinema ainda não é aqui no Brasil uma segura e contínua colocação.

A conhecida intérprete do nosso folclore veio, afinal, a ser contratada pela PRE-8, Rádio Nacional. Seu desempenho neste emissora era muito bom. Sua expressão, ótima. Ela continua a cantar no rádio com a sua voz bonita. E a agradar a quem a vê com a sua figura graciosa.

Agora, Sylvinha Mello voltou para o cinema. Enfim, o cinema a chamou de novo, para celebrizar quiçá como estrela de primeira grandeza. Ela deve partir dentro destes dias para o Ceará, disposta a ser filmada numa nova produção cinematográfica brasileira. A companhia que a convidou, uma sociedade americana de cinematografia, vai tentar mais um sucesso na nascente indústria cinematográfica brasileira. Sylvinha Mello vai tentar mais uma vez um outro sucesso em frente da câmera. Se desta vez ela desempenhar com apuro o seu papel, é quase certo que mais cedo ou mais tarde deixará mesmo o rádio de parte.

Todos os artistas têm grandes aspirações. Quem não vai gostar é o radiouvinte exclusivo de Sylvinha Mello ..."


Fonte: CARIOCA, de 13/3/1937 (texto atualizado e foto).

Leny Eversong: Sua Carreira Artística

"Leny Eversong é uma artista que se firmou na radiofonia nacional em menos tempo do que todos, inclusive ela própria, esperavam. O foxtrote tem em Leny uma grande admiradora e uma fiel intérprete. Parece que a nova estrela do "broadcasting" da Cidade Maravilhosa estudou psicologia da música negra norte-americana. E fez-se professora ...

Seu verdadeiro nome é Hilda Campos Filgueras. Nasceu na capital de São Paulo. Casou-se com Alvinho Filgueras, outro animador do rádio brasileiro, criador do grupo radiofônico "Os Namorados do Ar", de Santos.

Leny Eversong descobriu muito cedo os seus pendores para o canto. Aos treze anos de idade já cantava alguma coisa. Mas então nem sequer em sonhos ela cogitava de vir a enfrentar um microfone.

Cantou pela primeira na PRB-4, de Santos. Ali se conservou o tempo necessário para adquirir mais impulso e maior anseio. Procurou sempre interpretar músicas norte-americanas. Começou cantando-as em tradução. Depois no original. Seu pseudônimo já começava a ficar conhecido. Resolveu ir para a PRG-5, Rádio Atlântica, na mesma cidade paulista. Com isto pode-se dizer que ela correu todas as estações de Santos.

Na Rádio Atlântica se firmou definitivamente. Era intérprete número um da melodia norte-americana. Foxes, blues, rag-times ...

Por ocasião da visita da embaixada de artistas cariocas composta por Almirante, Castro Barbosa, Jayme Britto e o Conjunto Regional de Benedito Lacerda àquela estação emissora, Leny cantou em sua homenagem. Os artistas chegados do Rio retribuíram, tendo Castro Barbosa mostrado as suas possibilidades, secundado pelo Conjunto Regional de Benedito Lacerda, com este na flauta, Russo no pandeiro, e o resto ...

Chegado ao Rio, o Conjunto de Benedito Lacerda notificou a direção da Tupy sobre a arte de Leny Eversong. E como Carlos Frias ia para Santos, a PRG-3 aproveitou a sua viagem para chamá-la. Leny não demorou muito a chegar ao Rio de Janeiro.

A entrevista que Leny Eversong concedeu a CARIOCA resultou numa palestra agradável e interessante, de acordo com a própria artista.

— Que pensa do rádio? E do ouvinte?

— Penso que o rádio é um grande invento. Um formidável invento.

Ele auxilia muito o artista. Torna-se um propagandista ligeiro e mais eficaz do qualquer outro ... Quanto ao ouvinte acho que é muito camarada da gente e é muito gentil. É assim como um espírito invisível benéfico para nós, pois ele é uma das coisas que fazem com que o artista progrida para fazer jus a uma boa e contínua recepção ...

Um dos grandes anseios de Leny Eversong é entrar para o cinema brasileiro. Acha que a cinematografia nacional tem um brilhante futuro, pois começou pelos primeiros passos ... Este e o de ser grande estrela de rádio para seu nome alcançar fama em outros países do mundo, são os seus maiores anhelos (anseios). Julga assim que sua ambição não é incomensurável ...

— Quais as músicas que mais aprecia cantar?

— Em primeiro lugar gosto de cantar foxtrotes. Em geral a música dos negros norte-americanos. Parece que não, mas o ritmo destas melodias faz fremir o âmago da gente ... O meu compositor predileto é Duke Ellington. De vez em quando, porém, canto sambas e outras músicas do folclore brasileiro ... lá em casa, geralmente. Eu gostaria de aprender a interpretar tuto, tudo ...

E não está longe disso. Sua voz é um problema cheio de saídas. Pois se ela não só canta com voz humana como até imita instrumentos musicais! Quando está mais animada consegue uma perfeita imitação do sopro do pistão e do argênteo som da guitarra de Havaí! Já está apta a fazer os próprios acompanhamentos. E sem bateria ...

— Em que procura distrair-se?

— Eu estou sempre distraída, com franqueza. Quando não estou cantando, toco piano, repinico num violão qualquer coisa ... Gosto de pintura. Pinto em toda a parte, fundo de prato, quadros, almofadas ... Também gosto de ir ao cinema e ao teatro assistir a revistas. Leio semanalmente as seções de rádio e cinema de CARIOCA.

— Quais as suas novidades para o corrente ano?

— Por enquanto não posso afirmar nada. Tenho diversas propostas de contratos em vista para ir atuar nos rádios do sul. Talvez eu vá para a Argentina, talvez não ... Vou pensar ... Na Tupy espero lançar, paulatinamente, perto de duzentos foxes que ainda restam no meu repertório ..."


Fonte: CARIOCA, de 13/3/1937 (texto atualizado e foto de Leny, provavelmente com 17 anos)

Olga Praguer: Para os Fãs do Rádio

"Olga Praguer Coelho é uma das primeiras figuras do rádio no Brasil. A sua atuação frente aos microfones brasileiros data dos primeiros tempos da Rádio Sociedade.

Tem cantado em quase todas as estações do Rio, sendo atualmente exclusiva da Rádio Tupy.

Fora do Brasil, Olga Praguer tem cantado em inúmeros países: Argentina, Uruguai, Itália, Alemanha, Áustria, etc., mostrando a todo mundo, o que realmente belo possui o folclore brasileiro, de que é uma intérprete inigualável.

Tem apresentado e criado com grande sucesso um sem número de músicas, entre as quais, as suas adaptações de antigas modinhas imperiais e o "Canto da Expatriação", de Humberto Porto, gravado com o tenor mexicano Pedro Vargas."


Fonte: "Carioca", de 8/4/1937 (texto atualizado e foto).

Sambistas ...

Manuel Bandeira, um dos nossos maiores cronistas, acaba de publicar um interessante volume, "Chronicas da Província do Brasil" que é um agradável passeio entre as letras, as artes e recantos pitorescos da terra brasileira. O livro de Manuel Bandeira tem dois capítulos sobre João Baptista da Silva, o popularíssimo Sinhô.

O do enterro do autor de "Jura" é uma página sugestiva das mais curiosas do livro. Transcrevemos, nesta página, o outro capítulo, sob o título "Sambistas", em que o cronista narra um caso pitoresco e complicado de investigação da paternidade de um samba:

"Quando morreu o afamado Sinhô, escrevi para o "Diário Nacional" de São Paulo uma crônica em que recordava com saudade alguns traços curiosos da figura do rei do samba carioca. E contei uma cena a que tive o prazer de assistir em casa dos meus amigos Eugênia e Álvaro Moreyra.

Foi o caso que numa das extintas deliciosas quintas-feiras em que o casal recebia, apareceu o Sinhô e regalou os convidados não só com a sua conversação como com os seus sambas. Estava mal de voz, tossia muito (era a velha tuberculose que apertava o cerco), mas nenhum de nós teve a menor ideia de atribuir aquela tosse à terrível moléstia e, como era do mais elementar dever, poupar o doente.

O que nos desculpa daquela “descaridade” é que Sinhô para toda gente era uma criatura fabulosa, vivendo no mundo noturno do samba, zona impossível de localizar com precisão - é no Estácio mas bem perto ficam as macumbas do Encantado, mundo onde a impressão que se tem é que ali o pessoal vive de brisa, cura a tosse com álcool e desgraça pouca é bobagem. Assim quando Sinhô parava num acesso, ia-se buscar uma boa lambada de Madeira e o fato é que a tosse é que a tosse passava.

A acreditar no Sinhô, ele não tinha dormido na noite da véspera. Passara-a numa farra, e naquela manhã mesmo, ao regressar a casa, não fora bem recebido pelo seu bem, que naturalmente estava ralado de ciúmes.

Contou Sinhô que foi então para o piano e improvisou um samba, que entoou para nós ainda com as hesitações das coisas inacabadas. Era gostosíssimo e parecida do melhor Sinhô. (Ninguém duvidou que não fosse dele.) Lembro-me bem da toada e da letra do estribilho:

Já é demais,
Meu bem, já é demais!
Eu já notei que tu queres me acabar...


Fizemos o Sinhô repetir a toada um sem-número de vezes. Todos os presentes já o sabiam de cor e secundavam em coro quando chegava a hora do "já é demais". Foi isso em fins de 1929.

***

Há pouco mais de um mês um amigo meu, que se interessa atualmente por modinhas policiais, pediu-me umas informações, e para servi-lo andei correndo os olhos na literatura de cordel. Fui à toa à Praça Tiradentes onde, sob as arcadas do antigo São Pedro, havia um vasto estenderete do gênero. O café da esquina da Rua das Marrecas estava em demolição. Mas passando por lá de bonde verifiquei que nos andaimes da reconstrução os cordelinhos de engraxate resistiam bravamente à poeira. Lá pude arranjar uma pequena coleção de "liras" que remontavam até 1927.

Vim para casa e correndo a vista por aquelas páginas sujíssimas deparei num dos cadernos com o título "Já é demais". Abaixo dele vinha a informação: "Letra e música de seu Candu". Ora, lá estava o estribilho do samba de Sinhô:

Já é demais, meu bem,
Meu bem já é demais!
E hoje já notei
Que tu queres me acabar...


Verifiquei logo que o plágio não podia ser de seu Candu, porque a publicação era de 1927 (editor Menotti Carnaval, depósito Rua General Pedra, 169) e de resto havia ainda a indicação abaixo do título de que o "Já é demais" era choro do carnaval de 1925, o que estava aliás provadíssimo pelo contexto da letra todo cheio de alusões aos fatos revolucionários de 1924:

Lá no morro de S. Carlos
É lugar de pretensão.
Já botaram metralhadoras
Pra brigar com aviação.


Ainda não pude descobrir quem conhecesse a toada do choro do seu Candu. Em todo o caso está claro que Sinhô avançou no refrão de seu Candu.

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Isso tudo me fez refletir como é difícil apurar afinal de contas a autoria desses sambas cariocas que brotam não se sabe donde. Muitas vezes a gente está certo que vem de um Sinhô, que é majestade, mas a verdade é que o autor é seu Candu, que ninguém conhece.

E afinal quem sabe lá se é mesmo de seu Candu? Possivelmente atrás de seu Candu estará o que não deixou vestígio de nome no samba que toda a cidade vai cantar. E o mais acertado é dizer que quem fez estes choros tão gostoso não é A nem B, nem Sinhô, nem Donga: é o carioca, isto é, um sujeito nascido no Espírito Santo ou em Belém do Pará."


Fontes: "Carioca" - Edição 77, de 10/4/1937; Yahoo Grupos: transcrição de Maria do Carmo - "In" Manuel Bandeira - Poesia Completa e Prosa, Editora Nova Aguilar S.A., RJ, 1983, págs. 463/465 (texto revisado).

Darcy de Oliveira: O Pandeirista

Darcy de Oliveira, pandeirista / compositor, foi um artista notável nas décadas de 1930 e 1940, mas que, mesmo assim, como a grande maioria dos músicos de sua época, hoje em dia é um nome esquecido.

Não há dados biográficos sobre ele nos trabalhos mais fundamentais que reúnem informação biográfica de nomes da música brasileira, como os livros pioneiros do Ary Vasconcellos, a Enciclopédia da Música Brasileira ou o dicionário musical on-line do Ricardo Cravo Albin. E mesmo uma busca mais exaustiva na literatura revela apenas breves menções de suas composições.

Um conjunto de fotografias, partituras manuscritas e impressas, assim como vários outros documentos que pertenceram ao Darcy de Oliveira estavam em poder de um familiar seu que veio a falecer, tendo, então, sido todos aqueles papéis descartados ao lixo. Pessoas que comercializam material reciclado resgataram estes papéis, que enfim vieram parar em minhas mãos. Baseado neste material, disponibilizo aqui alguma informação biográfica sobre este personagem.

Darcy de Oliveira nasceu em 16 de março de 1905, em Porto Alegre, filho de Álvaro Branco e Clara Dorneles de Oliveira. Ainda em sua cidade natal participou de grupos como Bohemios Rio-grandenses, liderado pelo cavaquinista Ary Valdez, e Voz do Sul, com o qual fez apresentação no Uruguai. Também atuou muito frequentemente ao lado do flautista gaúcho Dante Santoro.

Participou do carnaval porto-alegrense compondo para a então famosa agremiação carnavalesca “Divertidos atravessados”, e para os ranchos “Almirantes Carnavalescos” e “Não sei”, tendo sido organizador deste último.

No Rio de Janeiro, foi pandeirista, por exemplo, do conjunto regional da RCA Victor, liderado por seu amigo Dante Santoro, do qual também eram integrantes Pereira Filho e Ney Orestes, nos violões, e Ary Valdez, no cavaquinho.

Sua estreia em disco, foi através da voz de Aracy de Almeida, com o samba “Pedindo a São João”, feito em parceria com Herivelton Martins e lançado para as festividades juninas de 1935. No ano seguinte o samba “Se o morro não descer”, que fez com o mesmo parceiro, foi um dos sucessos do carnaval.

Seus parceiros mais frequentes foram Herivelton Martins e Benedito Lacerda, mas Darcy de Oliveira também compôs em parceria com Wilson Baptista, Ataulfo Alves, Roberto Roberti, Waldemar Gomes dentre outros.

Suas composições foram gravadas por cantores consagrados, como Francisco Alves, Carmem Miranda, Aurora Miranda, Sílvio Caldas, Almirante, Ademilde Fonseca, Dircinha Batista, Moreira da Silva, além da já citada Aracy de Almeida.

Darcy de Oliveira faleceu em sua residência na Rua dos Arcos, no bairro da Lapa, Rio de Janeiro, no dia 31 de março de 1945, em consequência de complicações de saúde.

Anos mais tarde sua filha Lourdes de Oliveira tornou-se atriz, estreando na personagem Mira do premiado filme “Orfeu do Carnaval”, do diretor francês Marcel Camus, com quem casou e teve dois filhos. Consegui arrolar até o momento cerca de 80 músicas de Darcy de Oliveira, a maioria inédita em disco.


Fontes: Revista Música Brasileira - Darcy de Oliveira, compositor e pandeirista; Semanário “Carioca”, de 10/4/1937; Anotações Sobre Música Brasileira: notas sobre o compositor e pandeirista Darcy de Oliveira (1905-1945) - Sandor Buys.